Empresas aumentam investimentos em eficiência energética, economia circular e outras estratégias para reduzir pegada de carbono.
Foto: André Mello/Arte O Globo
No setor industrial, a ordem do dia para lidar com as questões socioambientais é “transversalidade”. Com as cobranças crescentes de governos e da sociedade diante da emergência climática, a régua não para de subir. Não basta encaminhar resíduos para a reciclagem e reduzir as emissões de gases de efeito estufa (GEE).
É preciso descarbonizar de verdade, aumentar a eficiência energética, ir além do que manda a lei para despoluir as águas, integrar economia circular aos processos e abandonar antigos modelos lineares, poluentes e geradores de lixo.
O setor industrial, responsável por 20,4% do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil, segue, como outros setores, o desafio de crescer de forma sustentável. Dados do Observatório do Clima mostram que, em 2021, os processos industriais sozinhos responderam por 4,5% das emissões de GEE no Brasil, cerca de 108 milhões de toneladas de gás carbônico equivalente (tCO2e).
Isolado, o percentual parece pequeno, mas quando consideramos que parte das emissões de energia e resíduos está ligada à indústria, a conta sobe. Essas duas linhas responderam por 17,9% e 3,8% do total de emissões do país em 2021, respectivamente. Dentre tantas frentes que o setor industrial precisa atacar, as metas de lixo zero e carbono neutro são as mais relevantes e desafiadoras.
As soluções para o setor industrial, de acordo com o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) das Nações Unidas, passam por expandir o uso de energia limpa em sistemas de aquecimento, ventilação e ar-condicionado, transporte e maquinário industrial.
Melhorar a eficiência energética das máquinas, reduzir a demanda de materiais com soluções de economia circular e implementar tecnologias de captura e armazenamento de carbono em setores intensivos de emissões, como na indústria do cimento, são igualmente importantes.
Tecnologias já existem
A boa notícia é que as tecnologias para isso já existem e têm se popularizado. Os custos de fontes renováveis de energia caíram drasticamente na última década, e o hidrogênio verde para substituir combustíveis fósseis em indústrias do aço, cimento, petroquímico, cerâmico e de transportes pode ser um divisor de águas. No entanto, o próprio IPCC destaca que essa transição para uma indústria mais limpa vai exigir entre cinco e 15 anos de “inovação, comercialização e política intensivas”.
Para o engenheiro ambiental especializado em avaliação do ciclo de vida, Aldo Roberto Ometto, professor da USP, essa jornada passa por elaboração de diagnósticos precisos e conscientização de toda a cadeia produtiva:
– As empresas estão focadas na busca por resultados. Ao vender mais, melhorar a escala e reduzir custos, gera-se mais resíduo, naturalmente. Como internalizar conceitos de lixo zero e descarbonização? Precisamos mudar a maneira de pensar, incorporando à estratégia a geração de valor no contexto do século 21, que leve em consideração variáveis sociais e ambientais.
Mônica Messenberg, diretora de Relações Institucionais da Confederação Nacional da Indústria (CNI), diz que mais empresas do setor se comprometem com metas climáticas e aumentam aportes em descarbonização de processos:
– As emissões de gases de efeito estufa das cimenteiras, por exemplo, são 11% menores do que a média mundial. No setor de alumínio, cerca de 60% de todo o insumo nacional é reciclado. O de papel e celulose, que destina nove milhões de hectares ao cultivo de árvores para fins industriais, preserva outros 5,9 milhões de hectares de florestas nativas.
Ela acrescenta que a indústria química brasileira conseguiu reduzir 44% de suas emissões entre 2006 e 2016 enquanto a do vidro tem evitado o lançamento à atmosfera de 100 mil toneladas de GEE por ano com a reciclagem de 400 mil toneladas. A CNI estimula esses movimentos entre os associados a partir de quatro pilares: transição energética, mercado de carbono, economia circular e conservação florestal.
Em eficiência energética, por exemplo, a entidade mantém o programa Aliança, em parceria com a Eletrobras e a Associação dos Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace). Ele aconselha grandes fábricas sobre como produzir mais com menos energia. Entre 2017 e 2020, ajudou a economizar R$ 122 milhões, equivalente a 176 GWh. Neste ano, serão investidos R$ 20 milhões em projetos desse tipo de 24 indústrias.
Na fabricante de móveis paulistana Breton, por exemplo, toda a madeira é certificada como vinda de reflorestamento e 100% da água vem de reúso. Nas lojas e fábricas, um sistema de iluminação natural na maior parte das áreas comuns reduz o consumo de energia, que é suprido em boa parte por painéis solares.
A cada pedido on-line, a Breton planta uma árvore, em parceria com a SOS Mata Atlântica. Já foram plantadas 14.285 árvores entre 2018 e 2022, somando investimentos de R$ 140 mil. Também oferece um prêmio de R$ 30 mil a jovens designers que tragam ideias de uso de matérias-primas sustentáveis.
E persegue a meta do lixo zero. Ao fazer uma entrega na casa ou empresa de um cliente, imediatamente recolhe todo o papelão usado nas embalagens, parafusos e outros itens, para serem encaminhados à reciclagem.
– Temos por objetivo devolver à natureza tudo o que ela nos proporciona — diz Giselle Rivkind, diretora de Marketing e integrante da terceira geração à frente da empresa, fundada em 1967.
– Contamos com parceiros para fazer a gestão de cada categoria de resíduo gerado na produção dos móveis, desde o pó de madeira, até aparas de corda, sobras de tintas, metais, produtos químicos e plásticos.
Davi Bomtempo, gerente-executivo de Meio Ambiente e Sustentabilidade da CNI, lembra que entre os maiores desafios do setor industrial está o acesso aos financiamentos para uma transição verde. Enquanto as grandes já avançam, as pequenas indústrias nem sempre conseguem entregar as comprovações de solidez financeira.
A CNI oferece mecanismos de garantias coletivas, para que micros e pequenas possam acessar empréstimos de maneira conjunta — diz ele, citando outro gargalo: a escassez de mão de obra especializada para lidar com as novas tecnologias da economia de baixo carbono.
– Cada vez mais precisaremos de engenheiros no campo da produção de hidrogênio verde, por exemplo.
De acordo com o Bomtempo, a CNI está formando parcerias para qualificar profissionais principalmente para as áreas de energias renováveis e biocombustíveis.
(Fonte: O Globo – Por Lúcia Helena de Camargo, Especial Para O Prática ESG – 18/01/2023).